quarta-feira, 7 de setembro de 2016

Para além do vício e da palavra

          Hemingway escrevia ao sabor do mojito. Joyce facinava Lacan por  fruir a linguagem  pela via do sinthoma. Clarice, dizem por aí, atuava nessa mesma conjunção entre letra e gozo. Drummond confiava o seu escritório ao guardião da vida intelectual, o gato. Voltaire era alucinado por café, mas, como sabemos, a bebida preferida dos filósofos é o vinho. Sócrates preferiu tomar cicuta a conviver com Xantipa. Já o poeta Dylan Thomas, conseguiu proeza parecida após ingerir 18 doses de whisky.

          Sempre há aqueles menos alucinados: Lygia Fagundes Telles tomava chá com Mário de Andrade. Eu tento não ficar para trás, às vezes aqueço-me com pequenas doses de Jack Daniel's, alegro-me com um Lambrusco, acalmo-me com infusões de camomila, amora, hortelã pimenta. Sou sensível. Recorro aos óleos essenciais, feito lavanda e alecrim. Ajudam, não muito. 

          Eu queria fazer tudo e ser toda, não posso fazer tudo, nem posso ser toda. Todas as vezes que tentei, machuquei. Fazer tudo e ser toda, implicam em exagero. Temos que aprender: o ótimo é inimigo do bom. Os exageros estão onde menos esperamos, algo ou alguém que parece nos fazer bem, embora faça, às vezes passa do ponto e faz mal. 

          Dar conta daquilo que passou da conta, demora. Saber daquilo que não se quer saber, exige muita coragem. Dar-se conta dói. Há que ser forte para superar, até quando dá vontade de desistir de tudo. Inventar maneiras de resistir quando tudo deixa de fazer sentido. Há que se encontrar novas alegrias, fazer novas transferências. 

          Por isso criei o blog. Porque os chás acalmam, mas só ajudam, remédios têm efeitos colaterais e, além disso, não servem para tudo. Palavras não bastam, mas parecem uma droga menos nosciva, possibilitam voar repetidas vezes com os pés no chão. 

          Cair com as palavras não tem tanto impacto quanto do 33º andar, não que estejam insentas de riscos: palavras têm efeitos! Embora eu saiba brincar e jogar com as palavras, tenho aprendido a organizá-las de modo a interpretar as narrativas (do cotidiano, filmes e livros) como possibilidades para produzir efeitos melhores daquilo que se passa.

4 comentários:

  1. Inquietações. Inquietudes. Nunca passam. Que bom. Mas há quexsaber dosar. Há que se feicar pra lá. Nem tudo vale a pena de se preocupar. Deixe fluir.
    Beijo, Livia. Lindo, como sempre.

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  2. Inquietações. Inquietudes. Nunca passam. Que bom. Mas há quexsaber dosar. Há que se feicar pra lá. Nem tudo vale a pena de se preocupar. Deixe fluir.
    Beijo, Livia. Lindo, como sempre.

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